Dentre as práticas empresariais, é relativamente comum nos depararmos com companhias que possuam entre seus critérios remuneratórios o pagamento de comissões. De modo geral, as comissões são entendidas como recompensas financeiras advindas de negociações bem-sucedidas ou ainda do cumprimento de metas pré-definidas, servindo como ferramentas de estímulo aos resultados comerciais.
Nesse sentido, dependendo dos critérios de seu adimplemento, existirão situações em que serão devidas aos empregados que tiverem seus contratos de trabalho rescindidos as chamadas comissões futuras.
Por comissões futuras entendemos aquelas cuja aferição e pagamento ainda não eram possíveis no momento da rescisão contratual, sendo os seus valores posteriormente creditados aos trabalhadores envolvidos.
Aqui, importante que relembremos que essa forma de pagamento é totalmente cabível, encontrando-se, inclusive, prevista junto ao artigo 466 da Consolidação das Leis do Trabalho, que assim dispõe:
“Art. 466 – O pagamento de comissões e percentagens só é exigível depois de ultimada a transação a que se referem.
§ 1º – Nas transações realizadas por prestações sucessivas, é exigível o pagamento das percentagens e comissões que lhes disserem respeito proporcionalmente à respectiva liquidação.
§2º – A cessação das relações de trabalho não prejudica a percepção das comissões e percentagens devidas na forma estabelecida por este artigo”.
Da mera interpretação do conteúdo legal, podemos extrair a conclusão de que o pagamento de comissões após a rescisão dos contratos de trabalho é permitido. Superado isso, passamos a analisar a forma de viabilização desse pagamento junto ao ambiente do eSocial, momento em que nos deparamos com o fato de que o sistema não admite lançamentos a título de comissões após o envio das informações de desligamento.
Esse impasse fora questionado junto ao ambiente de esclarecimento de dúvidas do eSocial (Perguntas Frequentes 04.53), e a resposta obtida demonstrou que o posicionamento adotado é contrário à interpretação dada ao artigo 466 da CLT:
“(…) Conforme entendimento do Ministério do Trabalho (Nota Técnica 87/2013), os pagamentos vinculados a competências posteriores à rescisão de um trabalhador, permitidos pela legislação, são apenas aqueles constantes do leiaute (quarentena, PLR e stock option).
As comissões devem ser pagas até o décimo dia após o desligamento do trabalhador, conforme Art. 477, §6º, da CLT. A lei permitiu que o pagamento da comissão ao trabalhador fosse feito em periodicidade coincidente com o pagamento da prestação da operação de venda apenas quando há a continuidade da relação de emprego. A extinção do contrato de trabalho antecipa o prazo para o pagamento de todas as comissões devidas ao trabalhador”.
No mesmo sentido, o Manual de Orientações do eSocial (versão 2.5.01) reforça a necessidade de pagamento antecipado das parcelas pendentes elucidando, entretanto, o procedimento a ser adotado pelos empregadores nas situações em que houverem lançamentos de comissões posteriores à rescisão contratual:
“O desligamento do empregado/servidor encerra o vínculo contratual existente com aquele empregador/órgão público e antecipa todas as parcelas salariais devidas e já conhecidas, tais como comissões pendentes e percentagens, que devem ser liquidadas e informadas neste evento. O pagamento destas parcelas após o desligamento implica na retificação do evento S-2299”.
Dessa forma, nas rescisões contratuais envolvendo empregados comissionados, caberá às empresas verificar a existência de pagamentos futuros juntamente com a sua viabilidade de previsão e quitação antecipada. Na impossibilidade de antecipação, a informação de pagamento após a rescisão do contrato de trabalho somente ocorrerá mediante a retificação do evento S-2299 (desligamento) no eSocial, consolidando os valores a título de comissões nas verbas rescisórias aí informadas. A retificação do evento de desligamento, no entanto, acarretará no recálculo sistêmico, sujeitando a empresa ao pagamento dos encargos (FGTS e contribuições previdenciárias) daí decorrentes acrescidos dos juros e das multas pelo suposto atraso no pagamento.
A reabertura do evento S-2299 poderia ser encarada como uma forma de denúncia espontânea, onde a empresa reconhece, antes de qualquer questionamento, as diferenças de pagamentos informadas. Sendo esse o caso, o artigo 138 do Código Tributário Nacional é expresso ao afastar a
responsabilidade do contribuinte em arcar com o pagamento de multas incidentes sobre os valores espontaneamente declarados. Esse procedimento é relativamente comum e facilmente operacionalizado por meio das transmissões de GPS e GFIP o que não acontece no ambiente do eSocial, cuja estruturação não se encontra preparada para essa necessidade.
Em contrapartida, há ainda quem defenda outras formas de quitação desses montantes, mediante a emissão de Recibo de Pagamento Autônomo (RPA) ou proposição de ação de consignação em pagamento, por exemplo. Tais opções representam dificuldade de operacionalização interna e, de todo modo, não garantem o adimplemento da obrigação de informação junto ao eSocial, podendo surgir questionamentos futuros.
De todo modo, o conteúdo do parágrafo 2º do artigo 466 da Consolidação das Leis do Trabalho, juntamente com o fato de que a retificação prevista pelo manual não representar adequadamente a realidade dos pagamentos realizados, podem demonstrar uma tendência de futuros ajustes e adequação do recém-desenvolvido ambiente do eSocial, o que vem acontecendo, inclusive, para outras situações de inconsistências reportadas.
Artigo desenvolvido pela equipe de Previdenciário, publicado pelo Conjur em 27/01/2019.